Em seu art. 43, §3º, dispõe a Lei nº 8.666/1993 ser “facultada à Comissão ou autoridade superior, em qualquer fase da licitação, a promoção de diligência destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do processo, vedada a inclusão posterior de documento ou informação que deveria constar originariamente da proposta”.
Havendo
alguma falha formal, omissão ou obscuridade nos documentos de habilitação e/ou
na proposta há um poder-dever por
parte da Comissão de Licitação/Pregoeiro em realizar a diligência, superando-se
o dogma do formalismo excessivo e prestigiando a razoabilidade e a busca pela
eficiência, ampliação da competitividade e a proposta mais vantajosa para a
Administração.
É irregular a inabilitação de licitante em razão de
ausência de informação exigida pelo edital, quando a documentação entregue
contiver de maneira implícita o elemento supostamente faltante e a
Administração não realizar a diligência prevista no art. 43, § 3º, da Lei
8.666/93, por representar formalismo exagerado, com prejuízo à competitividade
do certame.
(Acórdão TCU nº 1.795/2015-Plenário)
É irregular a desclassificação de empresa licitante
por omissão de informação de pouca relevância sem que tenha sido feita a
diligência facultada pelo § 3º do art. 43 da Lei nº 8.666/1993.
(Acórdão TCU nº 3.615/2013-Plenário)
Ao constatar incertezas sobre o cumprimento de
disposições legais ou editalícias, especialmente dúvidas que envolvam critérios
e atestados que objetivam comprovar a habilitação das empresas em disputa, o
responsável pela condução do certame deve promover diligências para aclarar os
fatos e confirmar o conteúdo dos documentos que servirão de base para a tomada de
decisão da Administração (art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993).
(Acórdão TCU nº 3.418/2014-Plenário)
Note-se,
portanto, que a realização de diligência destinada a esclarecer ou a
complementar a instrução do procedimento licitatório independente de previsão
em edital[1], sendo
decorrente dos princípios da Administração Pública e da própria disposição
legal contida no art. 43, §3º, da LGL. A seu turno, no tocante à modalidade
pregão, na forma eletrônica, estabelece o Decreto Federal nº 5.450/2005, em seu
art. 26, §3º:
§ 3º No julgamento da habilitação e das propostas, o
pregoeiro poderá sanar erros ou falhas que não alterem a substância das
propostas, dos documentos e sua validade jurídica, mediante despacho
fundamentado, registrado em ata e acessível a todos, atribuindo-lhes validade e
eficácia para fins de habilitação e classificação.
As
diligências têm por escopo, portanto:
1)
o esclarecimento de dúvidas;
2)
obtenção de informações complementares;
3)
saneamento de falhas (vícios e/ou erros).
No
tocante ao propósito de saneamento de falhas, para se avaliar a plausibilidade
de adoção de diligência é preciso identificar a natureza do vício (ou erro) ou
da omissão, se “formal”, “material” ou “substancial”.
TIPO
|
ENQUADRAMENTO
|
É POSSÍVEL O SANEAMENTO?
|
Erro formal
|
Quando um
documento é produzido de forma diversa da exigida.
Ex.: proposta em
padrão diverso do modelo exigido no edital, mas que apresenta todas as
informações essenciais.
|
Sim. Por uma
questão de instrumentalidade das formas, o documento poderá ser considerado
válido quando, embora produzido de forma diferente da exigida, atingir a
finalidade pretendida.
|
Erro material
|
Quando há falha de
conteúdo na informação, havendo evidente desacordo entre a vontade e o que de
fato foi expressado no documento.
Ex.: Erro de
cálculo na totalização do valor da proposta; grafia incorreta; erro na sequência
de numeração das páginas dos documentos.
|
Sim. Uma vez que
retrata a inexatidão material, refletindo uma situação ou algo que obviamente
não ocorreu, o erro material admite correção. Logo, o saneamento não acarretaria
em alteração quanto à substância do documento.
|
Erro substancial
|
Quando se refere à
natureza do negócio, ao objeto principal da declaração ou a alguma das
qualidades a ele essenciais (art. 139 do Código Civil).
A omissão ou falha
substancial prejudica o conteúdo essencial do documento, inviabilizando seu
adequado entendimento.
Ex.: Não
apresentação de documentação de habilitação no prazo previsto no edital; indicação
de produto com especificações incompatíveis com as exigidas.
|
Não, uma vez que
se trata de vício insanável, posto que relacionado à substância do documento.
A eventual correção acarretaria na substituição de informações essenciais ou,
ainda, na inclusão posterior de documento que nãol se refira a mera
complementação ou esclarecimento.
|
Com
efeito, não será juridicamente viável a realização de diligência tendente a sanear
irregularidade essencial de determinado documento[2], alterar
a substância das propostas ou documentos de habilitação[3] ou,
ainda, acarretar na juntada de documento ou informação que, originalmente,
deveria constar da proposta[4].
O
respeito ao princípio da isonomia é garantido ao se reputar a diligência como
um dever da Comissão de Licitação/Pregoeiro, porquanto sabe-se, de antemão, que
o tratamento será o mesmo para todo e qualquer licitante, desde que seja
cabível a realização das diligências e não se trate de correção de
irregularidade essencial.
A
questão da juntada posterior de documento no procedimento licitatório
Há que se contextualizar a
problemática da adequada interpretação do disposto no art. 43, §3º, da Lei nº
8.666/93, no tocante ao dogma segundo o qual, em nenhuma hipótese, seria
permitida, no âmbito de um procedimento licitatório, a juntada de documento
posterior à entrega dos envelopes pertencentes aos licitantes.
Afinal, o dispositivo legal
deveria ser interpretado em sua literalidade? Em nenhuma hipótese,
independentemente da situação observada no caso concreto, admitir-se-ia a
realização de diligência por parte da Comissão de Licitação ou do Pregoeiro
que implique na necessidade de juntada de documento que não constava
originalmente no envelope entregue por licitante?
Partindo-se da compreensão de
que o objetivo maior do procedimento licitatório é a consecução do interesse
público aliada à observância dos primados da isonomia e igualdade de
tratamento e condições entre os participantes, há que se conferir uma
interpretação finalística e legitimadora ao texto insculpido no art. 43, §3º,
da Lei nº 8.666/93.
A inclusão posterior de documentos por parte da própria autoridade
condutora do certame licitatório deverá ser admitida desde que seja
necessária para comprovar a existência de fatos existentes à época da
licitação, concernentes à proposta de preços ou habilitação dos
participantes, porém não documentados nos autos.
Em outras palavras, não está o
§3º, art. 43, da Lei nº 8.666/93, em sua parte final, vedando toda e qualquer
possibilidade de juntada posterior de documento. O que dali se entende, dentro de uma visão consentânea com o
interesse público e com a finalidade da contratação, é que não será permitida
apenas a juntada de documento que comprove a existência de uma situação ou de
um fato cuja conclusão ou consumação deu-se após a realização da sessão de
licitação. Aí sim haveria burla ao procedimento e quebra do princípio da
isonomia e igualdade de tratamento.
Assim, caso a diligência promovida pela Comissão de Licitação ou pelo
Pregoeiro resulte na produção de documento que materialize uma situação já
existente ao tempo da sessão de apresentação dos envelopes, não há que se
falar em ilegalidade ou irregularidade.
Trata-se, assim, de um juízo de verdade real em detrimento
do pensamento dogmático segundo o qual o que importa é se o licitante
apresentou os documentos adequadamente, subtraindo-se o fato desse mesmo
licitante reunir ou não as condições de contratar com a Administração ao
tempo da realização do certame.
Com efeito, o Poder Judiciário
e as Cortes de Contas se inclinam em reconhecer que o procedimento
licitatório não deve ser pautado num formalismo exacerbado que desvirtue sua
finalidade e equipare-o a uma gincana, na qual interessa apenas o cumprimento
da etapa definida, indiferentemente de sua razão de ser.
Cumpre, ainda, consignar que o
próprio TCU, no Acórdão nº 1.758/2003-Plenário, entendeu ser regular, no
âmbito de procedimento licitatório, a conduta da autoridade que procedeu a
juntada posterior de comprovação de regularidade fiscal da licitante através
de diligência promovida com base no art. 43, §3º, da Lei nº 8.666/93. Segundo
aquela Corte de Contas, tal juntada não configuraria irregularidade, mas
praticidade, celeridade e otimização do certame. O apego excessivo à letra da
lei pode acarretar equívocos jurídicos, porquanto que não traduzem seu
sentido real.
A seu turno, em sede do Acórdão
nº 2.627/2013-Plenário, o TCU concluiu ser indevida a inabilitação de
licitante em razão da apresentação de atestado de capacidade técnica com data
posterior à da abertura do certame, uma vez que tal documento tem natureza
declaratória - e não constitutiva - de uma condição preexistente. Apontou-se
por equivocada a decisão do Pregoeiro consistente na inabilitação de
licitante em razão de “apresentação de
atestado de capacidade técnica com data posterior à da licitação".
Em relação a este ponto, o
relator (Min. Valmir Campelo) registrou que "o atestado de capacidade técnica tem natureza declaratória -e não
constitutiva – de uma condição preexistente. É dizer que a data do atestado
não possuiu qualquer interferência na certificação propriamente dita, não
sendo razoável sua recusa pelo simples fato de ter sido datado em momento
posterior à data da abertura do certame. O que importa, em última instância,
é a entrega tempestiva da documentação exigida pelo edital, o que, de acordo
com o informado, ocorreu".
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário